Brincar às Guerras
Transcrição do artigo do Expresso, edição de 2005.06.04
Brincar às Guerras
Pequenos bonecos são deslocados sobre uma mesa, como se de um campo de batalha se tratasse. Os comandantes são adultos, de 40 e 50 anos, que estudam a história militar de forma lúdica.
BETTMANN/CORBIS
Ilustração da batalha de Waterloo (1815)
À volta de mesas adornadas com cenários de guerra, lançam dados e movimentam as suas tropas. Cavaleiros dos exércitos napoleónicos de sabre em riste, legionários romanos que sobem uma colina ou tanques que tomam de assalto uma localidade. Os chefes militares são civis de 40 ou 50 anos que - garantem - não pretendem glorificar a guerra, mas simplesmente enriquecer os conhecimentos da história universal, de uma forma lúdica.
O termo correcto destes exercícios é «jogos de simulação», embora para quem está de fora possa ser «homens a brincar com soldadinhos», como os jogadores já se habituaram a ouvir. São pessoas de diversas profissões, que se encontram-se aos fins-de-semana, por norma aos sábados, para jogar às guerras. Nada de computadores ou outras «modernices», mas com pequenos bonecos - de chumbo e de outros materiais -, como antigamente.
VICTOR REICH-ROSA
Ataque da cavalaria napoleónica, com bonecos à escala 1/35
Movendo os seus soldados, tanques ou navios, denotam o entusiasmo de uma criança. Por vezes até se zangam durante os jogos. Por questões tão simples, como se é ou não possível disparar de determinada distância ou com certo ângulo. Mas, tal como na infância, «as birras passam depressa», asseguram. No entanto, num aspecto desta reportagem foram intransigentes: os jogadores que aceitaram falar não se deixaram fotografar; e os que mostram a cara querem manter o nome no anonimato.
Em Portugal é um fenómeno ainda pouco divulgado e com poucos voluntários alistados, ao contrário do que sucede, por exemplo, nos EUA ou no Reino Unido. Mas para os praticantes portugueses o tempo que dedicam a esta actividade não se limita àquele que dispensam em redor de uma mesa à procura de uma vitória no campo de batalha.
FOTOGRAFIAS DE VICTOR REICH-ROSA
Dois jogadores deslocam no tabuleiro os seus efectivos num «cenário de guerra fictício», segundo os conceitos dos jogos de simulação
A maioria dos jogadores documenta-se o mais possível sobre o seu período preferido, lê, investiga, troca opiniões com jogadores de vários pontos do mundo, contribui para a formulação das regras, colecciona figuras e há até quem pinte os seus próprios soldados, sempre da forma o mais fiel possível.
O rigor histórico é, de resto, um dos aspectos sagrados deste jogo e a exploração de «campos da História esquecidos pelos historiadores» um dos objectivos. Os jogadores lamentam que muitas vezes os historiadores foquem os aspectos económicos e políticos e se esqueçam das guerras. Contudo, sublinham repetidamente, não são militaristas nem tão pouco têm pretensão de substituir os historiadores. Mas juntos esforçam-se por recriar «como era». E depois... guerreiam-se.
Recriação de uma batalha da II Guerra Mundial, com movimentação de tanques
Em 1997, um grupo de clientes habituais do Lobo Branco, uma loja de venda de material para jogos, criou a Associação de Jogos de Simulação de Portugal, que hoje reúne quatro dezenas destes guerreiros devotos. Uma garagem adaptada, em Campo de Ourique, é o ponto de encontro e palco das batalhas. Os que os leva lá é inquestionavelmente o jogo pelo jogo. Não há factores de distracção: não há música ou bebidas, não se vêem sequer cinzeiros. O espaço é sóbrio, apenas decorado com algumas figuras em cartão de guerreiros da antiguidade, em tamanho real.
As escalas dos exércitos variam. De 1/300, figuras com 5 milímetros de altura, até 1/72. Consoante os jogos, algumas bases podem representar centenas de homens, outras um só guerreiro.
Com o desenrolar dos jogos, os cenários tornam-se também mais complexos e vistosos, com as explosões e as «baixas» a serem assinaladas, por exemplo, com algodão tingido de preto e pintado com laivos amarelos e vermelhos, numa simulação de fogo e colunas de fumo. Isto, naturalmente, em cenários de guerra no período posterior à descoberta da pólvora...
Curiosamente, as guerras mais populares entre os associados são as da Antiguidade Clássica. Mas o leque é vasto. Tão vasto quanto os conflitos que marcaram a Humanidade... e mais ainda. É que além de batalhas napoleónicas - também com muitos adeptos -, da guerra civil americana, da II Guerra Mundial ou do Vietname, também há jogos de «BTech». Para os leigos, Ficção Científica.
Paixões de infância
Vítor Amorim, 59 anos, projectista de arquitectura, segue uma batalha que se desenrola num cenário moderno fictício. A entrevista é interrompida frequentemente por dúvidas colocadas pelos jogadores, que desfaz de pronto. Conhece as regras como poucos. Durante 13 anos, entre 1976 e 1989, deu aulas a cadetes na Academia Militar. Precisamente através de jogos de guerra, pois dessa forma poupavam-se saídas para o terreno. «Era dinheiro metido no cofre».
Amorim simplificou as regras para jogos de sociedade. Adaptou a versão militar para uma versão civil, «mais praticável, menos académica». Mas, explica, a mecânica de jogo é a mesma, e aplica-se inclusivamente às guerras napoleónicas. «Os princípios básicos são imutáveis», diz.
Pormenores de um oficial alemão (com altura de 120 mm) e do avanço da infantaria inglesa (soldados com 28 mm)
«O desafio é recriar acções, testar soluções tácticas de guerra, a capacidade de improviso» em função de organizações com diferentes tipos de armas, em diferentes terrenos. O jogador desempenha essencialmente o papel de um posto de comando, assumindo «a coordenação e controlo de tudo», explica, enquanto olha atentamente para o tabuleiro e um jogador lhe pergunta se pode avançar com as suas forças por entre o bosque. Pode, mas progride mais devagar.
Outro perito em regras, mas de guerra arcaica, é «Jerboa», nome de guerra de um médico, de 43 anos, que prefere ser conhecido nestes meios apenas por este pseudónimo. Não é o único. Conta que cerca de 10% dos jogadores têm pseudónimos relacionados com períodos ou regras da sua preferência.
E é sob o pseudónimo de «Jerboa» que desenvolveu regras para jogos arcaicos e uma página na Internet, de onde as divulga para o Mundo. Em inglês, porque em português estaria apenas a dirigir-se para meia dúzia de curiosos, como o próprio aponta.
Em comum a estes adultos que gostam de brincar às guerras com pequenos soldadinhos de chumbo parece haver paixões de infância pelo jogo e pelo modelismo aliadas àquilo que designam de «grande curiosidade histórica».
A ligação de Vítor Amorim à associação é recente. Os jogos «uma consequência» de um gosto muito especial pela estratégia e pelo modelismo. «Inaugurei páginas de modelismo no ‘Jornal do Exército’», conta.
Para este desenhador, os «war games» são «um passatempo de pessoas interessadas por determinado tema militar de qualquer época», e que é retomado quando se atinge uma idade adulta, pois é então que «a vida está estabilizada». Também «Jerboa» retomou, há coisa de quatro anos, algo que o atrai desde a infância. Aliou o gosto intelectual à paixão antiga por «kits» de plástico.
«Há uma evolução etária muito curiosa», começa por observar. «Enquanto somos crianças, podemos brincar. Depois, vem a adolescência, em que tal não é aceite pelos pares. Segue-se a entrada na universidade e as pessoas afastam-se pela pressão social que é exercida. Vem depois a fase em que as pessoas se casam, têm filhos, e mesmo havendo interesse não há disponibilidade. Quando há por fim uma situação afectiva estabilizada, aí sim, as pessoas voltam».
FOTOGRAFIAS DE VICTOR REICH-ROSA
Batalha em cenário da II Guerra Mundial, com o avanço de carros de combate norte-americanos, numa zona já bastante devastada, defendida pela artilharia alemã
João Diogo, o presidente da associação, de 54 anos, admite que é habitual ouvir comentários depreciativos, do género «És um homem e vais brincar...» Também já se acostumou a ouvir falar em «soldadinhos» e «coisinhas». Este operador de som, que tomou o gosto pelos jogos de guerra, e em concreto pelas batalhas navais, desde os seus 16 anos, pertenceu ao núcleo dos cerca de 20 apaixonados que fundou a associação. Diogo diz que há fases na vida mais propícias para dedicar a esta actividade, mas considera ser possível conciliar os jogos com a vida familiar. Razão pela qual o ponto de encontro da associação está fechado ao domingo, «um dia tradicionalmente dedicado à família».
Entre os «aliados» com os quais a associação tem trabalhado, João Diogo aponta o Museu Militar, palco de diversos torneios, e a Liga dos Combatentes, com a qual pretende estreitar laços, de modo a garantir, por exemplo, a cedência de espaços para dormidas e refeições numa perspectiva de trazer ao país «guerreiros» de outras nações. Também procura apoios de instituições com vista a levar portugueses ao estrangeiro.
Dois jogadores discutem um movimento e o rigor da jogada é aferido por uma fita métrica. Por vezes, a defesa dos pontos de vista chega a ser exacerbada
João Diogo refuta a ideia de as actividades da associação glorificarem a guerra. «A associação não foi constituída com essa finalidade, não funciona desse modo, não é para cultivar o gosto militarista», afirma. Em relação a outra acusação, esclarece: «Não somos historiadores nem queremos ser. Queremos jogar coisas históricas», sintetiza.
O presidente da Associação de Jogos de Simulação de Portugal acredita que no nosso país haverá cada vez mais gente a jogar, a travar guerras antigas. «Tenho a certeza que é possível. Se os outros conseguem... Se existem clubes com grande profusão lá fora, até aqui em Espanha, por que não cá?», questiona.
Os jogos, é a opinião unânime, são o culminar de todo um «trabalho». Depois de toda a recolha de informação, da aquisição do material, da sua preparação para a guerra... nada como ver o «seu» exército em acção. E sob as suas ordens. Quase sempre há um vencedor, regra geral quando o exército inimigo regista 40% de baixas.
Há os chamados jogos de teste, onde se aproveita para desenvolver regras ainda «verdes», há os jogos amigáveis e há os jogos de torneio. E é nestes confrontos a «sério» que por vezes os adultos se comportam... como crianças.
«É como conduzir um automóvel», ironiza «Jerboa». «As pessoas mais civilizadas perdem completamente a compostura, principalmente quando se acumulam os '1’ nos dados» e vêem assim diminuída a sua capacidade de manobra.
Mas acaba sempre tudo em bem, assegura. E os adultos lá regressam a casa, por vezes atrasados para o jantar, depois de uma tarde inteira a brincar. Como há 30 ou 40 anos atrás. A única diferença é que, agora, o mais provável é receberem puxões de orelha das mulheres ou dos filhos.
BETTMANN/CORBIS
Ilustração da batalha de Waterloo (1815)
À volta de mesas adornadas com cenários de guerra, lançam dados e movimentam as suas tropas. Cavaleiros dos exércitos napoleónicos de sabre em riste, legionários romanos que sobem uma colina ou tanques que tomam de assalto uma localidade. Os chefes militares são civis de 40 ou 50 anos que - garantem - não pretendem glorificar a guerra, mas simplesmente enriquecer os conhecimentos da história universal, de uma forma lúdica.
O termo correcto destes exercícios é «jogos de simulação», embora para quem está de fora possa ser «homens a brincar com soldadinhos», como os jogadores já se habituaram a ouvir. São pessoas de diversas profissões, que se encontram-se aos fins-de-semana, por norma aos sábados, para jogar às guerras. Nada de computadores ou outras «modernices», mas com pequenos bonecos - de chumbo e de outros materiais -, como antigamente.
VICTOR REICH-ROSA
Ataque da cavalaria napoleónica, com bonecos à escala 1/35
Movendo os seus soldados, tanques ou navios, denotam o entusiasmo de uma criança. Por vezes até se zangam durante os jogos. Por questões tão simples, como se é ou não possível disparar de determinada distância ou com certo ângulo. Mas, tal como na infância, «as birras passam depressa», asseguram. No entanto, num aspecto desta reportagem foram intransigentes: os jogadores que aceitaram falar não se deixaram fotografar; e os que mostram a cara querem manter o nome no anonimato.
Em Portugal é um fenómeno ainda pouco divulgado e com poucos voluntários alistados, ao contrário do que sucede, por exemplo, nos EUA ou no Reino Unido. Mas para os praticantes portugueses o tempo que dedicam a esta actividade não se limita àquele que dispensam em redor de uma mesa à procura de uma vitória no campo de batalha.
FOTOGRAFIAS DE VICTOR REICH-ROSA
Dois jogadores deslocam no tabuleiro os seus efectivos num «cenário de guerra fictício», segundo os conceitos dos jogos de simulação
A maioria dos jogadores documenta-se o mais possível sobre o seu período preferido, lê, investiga, troca opiniões com jogadores de vários pontos do mundo, contribui para a formulação das regras, colecciona figuras e há até quem pinte os seus próprios soldados, sempre da forma o mais fiel possível.
O rigor histórico é, de resto, um dos aspectos sagrados deste jogo e a exploração de «campos da História esquecidos pelos historiadores» um dos objectivos. Os jogadores lamentam que muitas vezes os historiadores foquem os aspectos económicos e políticos e se esqueçam das guerras. Contudo, sublinham repetidamente, não são militaristas nem tão pouco têm pretensão de substituir os historiadores. Mas juntos esforçam-se por recriar «como era». E depois... guerreiam-se.
Recriação de uma batalha da II Guerra Mundial, com movimentação de tanques
Em 1997, um grupo de clientes habituais do Lobo Branco, uma loja de venda de material para jogos, criou a Associação de Jogos de Simulação de Portugal, que hoje reúne quatro dezenas destes guerreiros devotos. Uma garagem adaptada, em Campo de Ourique, é o ponto de encontro e palco das batalhas. Os que os leva lá é inquestionavelmente o jogo pelo jogo. Não há factores de distracção: não há música ou bebidas, não se vêem sequer cinzeiros. O espaço é sóbrio, apenas decorado com algumas figuras em cartão de guerreiros da antiguidade, em tamanho real.
As escalas dos exércitos variam. De 1/300, figuras com 5 milímetros de altura, até 1/72. Consoante os jogos, algumas bases podem representar centenas de homens, outras um só guerreiro.
Com o desenrolar dos jogos, os cenários tornam-se também mais complexos e vistosos, com as explosões e as «baixas» a serem assinaladas, por exemplo, com algodão tingido de preto e pintado com laivos amarelos e vermelhos, numa simulação de fogo e colunas de fumo. Isto, naturalmente, em cenários de guerra no período posterior à descoberta da pólvora...
Curiosamente, as guerras mais populares entre os associados são as da Antiguidade Clássica. Mas o leque é vasto. Tão vasto quanto os conflitos que marcaram a Humanidade... e mais ainda. É que além de batalhas napoleónicas - também com muitos adeptos -, da guerra civil americana, da II Guerra Mundial ou do Vietname, também há jogos de «BTech». Para os leigos, Ficção Científica.
Paixões de infância
Vítor Amorim, 59 anos, projectista de arquitectura, segue uma batalha que se desenrola num cenário moderno fictício. A entrevista é interrompida frequentemente por dúvidas colocadas pelos jogadores, que desfaz de pronto. Conhece as regras como poucos. Durante 13 anos, entre 1976 e 1989, deu aulas a cadetes na Academia Militar. Precisamente através de jogos de guerra, pois dessa forma poupavam-se saídas para o terreno. «Era dinheiro metido no cofre».
Amorim simplificou as regras para jogos de sociedade. Adaptou a versão militar para uma versão civil, «mais praticável, menos académica». Mas, explica, a mecânica de jogo é a mesma, e aplica-se inclusivamente às guerras napoleónicas. «Os princípios básicos são imutáveis», diz.
Pormenores de um oficial alemão (com altura de 120 mm) e do avanço da infantaria inglesa (soldados com 28 mm)
«O desafio é recriar acções, testar soluções tácticas de guerra, a capacidade de improviso» em função de organizações com diferentes tipos de armas, em diferentes terrenos. O jogador desempenha essencialmente o papel de um posto de comando, assumindo «a coordenação e controlo de tudo», explica, enquanto olha atentamente para o tabuleiro e um jogador lhe pergunta se pode avançar com as suas forças por entre o bosque. Pode, mas progride mais devagar.
Outro perito em regras, mas de guerra arcaica, é «Jerboa», nome de guerra de um médico, de 43 anos, que prefere ser conhecido nestes meios apenas por este pseudónimo. Não é o único. Conta que cerca de 10% dos jogadores têm pseudónimos relacionados com períodos ou regras da sua preferência.
E é sob o pseudónimo de «Jerboa» que desenvolveu regras para jogos arcaicos e uma página na Internet, de onde as divulga para o Mundo. Em inglês, porque em português estaria apenas a dirigir-se para meia dúzia de curiosos, como o próprio aponta.
Em comum a estes adultos que gostam de brincar às guerras com pequenos soldadinhos de chumbo parece haver paixões de infância pelo jogo e pelo modelismo aliadas àquilo que designam de «grande curiosidade histórica».
A ligação de Vítor Amorim à associação é recente. Os jogos «uma consequência» de um gosto muito especial pela estratégia e pelo modelismo. «Inaugurei páginas de modelismo no ‘Jornal do Exército’», conta.
Para este desenhador, os «war games» são «um passatempo de pessoas interessadas por determinado tema militar de qualquer época», e que é retomado quando se atinge uma idade adulta, pois é então que «a vida está estabilizada». Também «Jerboa» retomou, há coisa de quatro anos, algo que o atrai desde a infância. Aliou o gosto intelectual à paixão antiga por «kits» de plástico.
«Há uma evolução etária muito curiosa», começa por observar. «Enquanto somos crianças, podemos brincar. Depois, vem a adolescência, em que tal não é aceite pelos pares. Segue-se a entrada na universidade e as pessoas afastam-se pela pressão social que é exercida. Vem depois a fase em que as pessoas se casam, têm filhos, e mesmo havendo interesse não há disponibilidade. Quando há por fim uma situação afectiva estabilizada, aí sim, as pessoas voltam».
FOTOGRAFIAS DE VICTOR REICH-ROSA
Batalha em cenário da II Guerra Mundial, com o avanço de carros de combate norte-americanos, numa zona já bastante devastada, defendida pela artilharia alemã
João Diogo, o presidente da associação, de 54 anos, admite que é habitual ouvir comentários depreciativos, do género «És um homem e vais brincar...» Também já se acostumou a ouvir falar em «soldadinhos» e «coisinhas». Este operador de som, que tomou o gosto pelos jogos de guerra, e em concreto pelas batalhas navais, desde os seus 16 anos, pertenceu ao núcleo dos cerca de 20 apaixonados que fundou a associação. Diogo diz que há fases na vida mais propícias para dedicar a esta actividade, mas considera ser possível conciliar os jogos com a vida familiar. Razão pela qual o ponto de encontro da associação está fechado ao domingo, «um dia tradicionalmente dedicado à família».
Entre os «aliados» com os quais a associação tem trabalhado, João Diogo aponta o Museu Militar, palco de diversos torneios, e a Liga dos Combatentes, com a qual pretende estreitar laços, de modo a garantir, por exemplo, a cedência de espaços para dormidas e refeições numa perspectiva de trazer ao país «guerreiros» de outras nações. Também procura apoios de instituições com vista a levar portugueses ao estrangeiro.
Dois jogadores discutem um movimento e o rigor da jogada é aferido por uma fita métrica. Por vezes, a defesa dos pontos de vista chega a ser exacerbada
João Diogo refuta a ideia de as actividades da associação glorificarem a guerra. «A associação não foi constituída com essa finalidade, não funciona desse modo, não é para cultivar o gosto militarista», afirma. Em relação a outra acusação, esclarece: «Não somos historiadores nem queremos ser. Queremos jogar coisas históricas», sintetiza.
O presidente da Associação de Jogos de Simulação de Portugal acredita que no nosso país haverá cada vez mais gente a jogar, a travar guerras antigas. «Tenho a certeza que é possível. Se os outros conseguem... Se existem clubes com grande profusão lá fora, até aqui em Espanha, por que não cá?», questiona.
Os jogos, é a opinião unânime, são o culminar de todo um «trabalho». Depois de toda a recolha de informação, da aquisição do material, da sua preparação para a guerra... nada como ver o «seu» exército em acção. E sob as suas ordens. Quase sempre há um vencedor, regra geral quando o exército inimigo regista 40% de baixas.
Há os chamados jogos de teste, onde se aproveita para desenvolver regras ainda «verdes», há os jogos amigáveis e há os jogos de torneio. E é nestes confrontos a «sério» que por vezes os adultos se comportam... como crianças.
«É como conduzir um automóvel», ironiza «Jerboa». «As pessoas mais civilizadas perdem completamente a compostura, principalmente quando se acumulam os '1’ nos dados» e vêem assim diminuída a sua capacidade de manobra.
Mas acaba sempre tudo em bem, assegura. E os adultos lá regressam a casa, por vezes atrasados para o jantar, depois de uma tarde inteira a brincar. Como há 30 ou 40 anos atrás. A única diferença é que, agora, o mais provável é receberem puxões de orelha das mulheres ou dos filhos.
Texto de André Curvelo Campos
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